"A gente não quer só comida, a gente quer comida, diversão e arte". Se Arnaldo Antunes, Marcelo Fromer e Sérgio Britto, compositores da canção “Comida”, no ano de 1987, já previam que a sociedade necessitava da arte e da cultura assim como outros bens fundamentais à nossa existência, imagine o quanto esta composição ainda se encaixa nos dias atuais, com o excesso de informações e a ignorância política crescendo cada vez mais.
O que era para ser de todos, pertence apenas à elite de uma sociedade em que a banalização da cultura é mostrada todos os dias, com o novo grupo de axé, pagode, funk, etc. O que vale mesmo é ser o mais ridículo possível... E, mostrar os nossos valores reais? Pouco importa. Alias, nada importa, a não ser estar com o corpo todo sarado e o bumbum dentro dos parâmetros estabelecidos pelas revistas de moda.
Por trás desses disfarces todos, há uma agravante que vai para além dos nossos olhos: O que há com o que é nosso? Como podemos exigir os nossos direitos? Como podemos ter acesso aos patrimônios culturais se eles custam caros? Mas, oras, não eram para ser, por direito, de todos nós?
Como podemos assistir a shows dos grandes mestres da música popular brasileira, referencial em todo o mundo, como Chico Buarque, Caetano Veloso, Maria Bethânia, se o custo para isso é muito além da nossa realidade?
Mais do que grandes espetáculos ao ar livre esporadicamente, para a comemoração de datas especiais, o país necessita de uma política pública cultural com urgência, a cultura anda de mãos dadas com a educação. Enquanto esta educa e leva o indivíduo ao conhecimento, a cultura permite que as pessoas tornem-se mais capazes de lutarem por suas opiniões, mostrando a realidade dos fatos, permitindo que a sociedade deixe de agir de forma passiva a tantos abusos impostos, sejam estes políticos, educacionais e econômicos.
A verdadeira revolução possível é a cultural. Com a arte, podemos tirar as crianças das ruas, do mundo do tráfico, e trazê-las para o mundo das cores, das possibilidades, ensinando-as a preservar os prédios públicos, a valorizar as suas manifestações de pensamentos e habituar com as ações culturais.
No caso específico da cidade de Limeira, interior de SP, os festivais de música e de teatro têm dado um novo gás à população, esta que traz o tom para tais manifestações. As poltronas do Teatro Vitória (único teatro municipal da cidade) ficam lotadas de gente que não perde as apresentações artísticas. As ruas, com os espetáculos da categoria “teatro de rua”, chamam a atenção de todos que por ali passam.
Diante desse cenário, nota-se uma mistura agradável no público: é a criança que nunca teve chance de assistir a um teatro – que nem pisca os olhos com medo de perder algum gesto ainda melhor -, são os senhores e as senhoras que também nunca tiveram a chance de frequentarem um teatro, por acharem que a cultura é algo caro, o público que sempre acompanha a agenda cultural do município, etc. São todos espectadores buscando uma saída de emergência para a cabeça, que anda tão alienada pelos meios de comunicação, com a falta de esclarecimento e excesso de sensacionalismo. Com a arte, é possível respirar. É possível encontrar, dentro da alma, a emoção transbordada por uma palavra articulada, uma voz afinada, uma canção que traz saudade, amor ou dor.
Precisamos, com urgência, valorizar mais a cultura. Os governos precisam entender que esta seria a solução para uma sociedade melhor, menos violenta e conturbada. A cultura, quando acessada, desperta sentimentos escondidos em todos os indivíduos. E a troca não é unilateral. A cultura proporciona à pessoa uma incrível sensação de paz e inquietação... E, por sua vez, o sujeito busca um eterno encontro com a sua maneira de expressar-se, sem medo, sem receio... Acreditando em si. Triste contradição: acreditar em si vale mesmo a pena nesse mundo de tantas inversões de valores? Com a arte há a certeza que sim!
Busquemos sim a nossa comida! O mundo anda muito globalizado, o capitalismo potencializa tanto a desigualdade, e sem comida não há vida. Mas não deixemos de buscar (e lutar) pela cultura! Vamos dar as mãos. Acreditar no que é nosso. Valorizar o que é nosso. E, em coro, ecoarmos a canção escrita há mais de 20 anos, que diz tanta verdade. E, em reflexão, ficam as questões: “Você tem sede de que? Você tem fome de que?”.
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