segunda-feira, 20 de julho de 2009

Um pouco de dor

Foi hoje que ocorreu-me algo que há anos eu não fazia. Vasculhei fotos antigas! Acabei chegando mais cedo em casa, ando cansado, exausto para ser mais específico. Eu tento tanto ter tanto otimismo todos os dias, mas às vezes, reflexões temerosas tornam as minhas noites dias. Há alguns meses tenho pensado muito em meu pai. Poucos sabem sobre essa história. Eu sou tão feliz, tão pra frente que, por vezes, tenho medo de expor meus sentimentos fracassados. Quando eu tinha 6 anos, o meu super-herói foi embora de casa, para morar com outra mulher. Foi o pior momento que tive em minha vida, certamente. O meu pai era aquele homem que servia de exemplo pra todos. Ele me dava tantos beijos antes de partir ao trabalho. Fazia festas surpresas no meu aniversário. Sim, eu era pequeno mas, um dia, lendo um livro, ouvi que as melhores coisas que vivemos ficam marcadas em nossas lembranças para sempre. Estes episódios todos têm ficado marcado em mim e, sempre que me lembro, corta o meu coração e rasga a minha alma. Sinto saudades!

E, torturosamente, lembro-me de algumas cenas que fingo esquecer. Quando o casamento de minha mãe e de meu pai foi por água abaixo (foram 23 anos de casamento, feliz), a minha mãe entrou numa depressão horrível, ainda mais por conta da traição de meu pai com essa outra mulher. No início, tentei - mas fracassou - pedir ao meu pai para voltar. Ele ria, algumas vezes, dizia-me que era para parar de encher o saco dele. Encher o saco dele? Eu era apenas uma criança desesperada pelo super-herói que partira. Na minha cabeça, naquele momento, tudo foi muito complicado. Eu não entendia nada do universo dos adultos. Hoje compreendo melhor.

Acontece que, com o passar do tempo, com o crescimento mesmo... Eu fui me acomodando a ter um pai ausente. A minha mãe é que estava em todas. E, engraçado, ela sempre tentou mostrar-me o quanto que o meu pai era importante em minha vida, que eu deveria ir vê-lo, esquecer o que havia ocorrido...

Nunca consegui!

Talvez, ninguém que não tenha passado por isso sabe ao certo o que isso significa. Por isso é fácil, e simples, dizer: "já passou". É... Já passou mesmo, mas há marcas e cicatrizes que nos acompanham para sempre.

Sabe, eu já perdoei o meu pai pelos seus erros. Mas nunca vou aceitar essa outra mulher em minha vida mesmo. Talvez eu esteja errado. Talvez não... Mas ela quem chegou. O meu pai errou também, claro que errou, ele era casado. Mas foi ela quem chegou.

Tive uma infância diferente da maioria dos garotos. O Ricardinho, meu amigo de infância, não sabe o quanto ele e o seu pai foram importantes para mim. A minha mãe educou-me muito bem... Mas faltava a presença do paizão mesmo. O Japão - pai do Ricardinho - indiretamente tornou-se essa figura para mim.

Desculpem-me se as palavras ficaram desconexas. Mexer no passado arde tanto o peito. Mas é preciso!

Eu necessitava ver Japão todos os dias. Por vezes, nem conversávamos... Ele sempre foi quietão. Mas bastava um olá, um tudo bem, que o meu coração já disparava... Era como seu o meu próprio pai falasse comigo.

Em minha cabeceira, há uma foto antiga, que o meu pai aparece nela. Sem camiseta, com aquele olhar sedutor que acertou o coração de minha mãe. Na foto aparecem ela também e o meu irmão do meio, Rodrigo, e eu. Era um momento feliz. O nosso jardim era verde, as paredes pintadas, as flores vivas e coloridas, os sorrisos eram honestos... Da alma! Éramos uma família tão feliz e, o que me dói, é que ainda lembro muito bem disso e desse momento.

Poxa, eu tenho tanto medo, sabe? De sentir esse peso da ausência o tempo todo da minha vida. Eu já tenho 24 anos. Sou homem. Trabalho desde os 12... Me viro. Faço faculdade... Sonho em dançar valsa com a minha mãe. Vejam, já fazem quase 20 anos mas, sempre que tudo isso vem em minha cabeça, é como se fosse ontem.

Os berros e as lágrimas de minha mãe implorando para que o meu super-herói não se fosse. O amor dela agora não mais correspondido. Os meus irmãos tendo que ajudar no sustento de casa... Mas, acreditem, o que mais doía era a ausência dele nas reuniões escolares. Era ele não reservar mais os sábados para que - apenas eu e ele - fôssemos soltar pipas no Limeirão, ou jogar um futebol na caixa d´água perto de minha casa... Era essa ausência mesmo que mais doía! Gente, doía muito.

Hoje o meu pai não está bem. Vítima de diabetes encontra-se num estado bastante crítico. Depois de anos fui visitá-lo, um pouco depois do ano novo de 2009. Não o reconheci. Chorei feito criança.

Ele não enxerga mais. Eu queria falar com ele, mas as palavras perdiam força para as dilacerantes lágrimas. Apertei a sua magra mão direita. A beijei. Escondendo o choro, rezei muito por ele e o perdoei. Por tudo! Tudo mesmo. Aliviou.

Não o vi mais. Mas a foto prossegue na cabeceira de meu quarto, inventando um mundo feliz, inventando uma realidade que jamais voltará. E quando lembranças me invadem, choro e escrevo. Mas sei que esta é a saudade que jamais será saciada. São muitos momentos roubados...